sexta-feira, março 10, 2006



A Brokeback de cada um....



"Porque aquilo que hoje dizem à boca pequena um dia será proclamado em cima dos telhados..."
Quantos eventos fundamentais na narrativa bíblica envolvem uma montanha? Foi nela que o Cristo ensinou a partilha e seu principal mandamento: "Amai-vos uns aos outros.". Também de um monte ele orou para alcançar a transcendência da Ressurreição e expirou daqui para um mundo que jurava ser melhor que este.
Uma montanha tomou conta do imaginário mundial nos últimos dias. Ela esteve no cinema, no Oscar, no livro com o conto lançado no Brasil e neste blog. Por que "Brokeback" nos incomodou tanto?
Ontem, terminei de ler o conto.... lágrimas nos olhos enquanto esperava por 45 minutos na fila de um banco. A vida ordinária que não está na mídia...Chorei, o que não consegui fazer quando terminei de ver o filme. A sensação do "enviesamento" da garganta deu lugar a essa percepção que agora publico, ou melhor, blogo.
Primeiramente, creio que percebi a força da lenda bíblica que circunda o filme. Um libelo de amor ao próximo, um desejo barrado pelo medo e pelo preconceito que ronda todos os corações, e que, sim, podem sombrear todos os relacionamentos, sejam eles homo ou heterossexuais.
Mas, mais do que cristão, a pergunta que me fiz, foi: onde está a minha Brokeback? Se "a fé move montanhas", o amor ao próximo pela metáfora do filme/livro deve nos fazer escalá-las. E então eu lembrei e entendi por fim, porque gosto tanto do Rio e especialmente de Ipanema.
Lembro-me como se minhas emoções estivessem invadidas pela clareza do sol e do céu límpido daquela manhã que nascia em maio de 2001 que subi na pedra mais alta do Arpoador e lá contemplei a Vida. Um ritual que, demorei muito para compreender e repito inconscientemente todas as vezes que vou ao Rio.
(Abro um parênteses para registrar minha surpresa na tarde do último verão, quando tranqüilamente sentado no "posto 8 e meio", percebo que da Farme de Amoedo você enxerga no alto da montanha do Corcovado o braço direito do Cristo Redentor que parece acariciar a cabeça de todos o que por ali passam...)
Naquela manhã era Jack e nos dias posteriores fui Ennis porque me acovardei e não soube lidar com meus próprios fantasmas e preconceitos. E na verdade, o maior preconceito sempre está dentro de nós. Principalmente, nos momentos em que não nos julgamos dignos ou merecedores dos presentes que o destino ou a vida nos dá....
Sobrou dali um cartão-postal imaginário que eu trago comigo e não uma camisa suja de sangue, mas um velho chaveiro que até hoje prende o meu molho de chaves...e a sensação que sentir de verdade é bom, traz paz e conforto, mesmo quando não atingimos em ato tudo aquilo que se desenhou em potência dentro de um "nós" recém-acontecido...
Ali, no alto daquela montanha eu rezei e achei que estivesse de volta à minha essência. E creio estava. Mais uma vez, perdi-me dentro de meus próprios enganos. Labirinto que eu insisto em percorrer por fraqueza. O mundo não é dos covardes. Assim como Ennis também escolhi ficar com a camisa e as lembranças, quando poderia ter tido a montanha inteira.
Vingança do tempo. Então hoje, prefiro as histórias que não sejam dramáticas quando narram amores gays ou proibidos. Creio que é tempo de termos um final feliz e "Banquete de Casamento" é isso. Mas "Brokeback" sempre nos indicará o caminho... o que não devemos fazer para abrirmos mão daquilo que, muitas vezes, sequer percebemos a importância no momento em que está acontecendo.
Desde 2001 eu nunca mais senti acender a centelha. Aquela mesma que aquece o espírito e nos faz ser um ser-humano melhor. Meu coração está gelado como a velha montanha onde Ennis e Jack se aqueceram.... Se acidente ou "chave-de-roda" pouco importa. Tudo sempre pode ser de outra forma se assim nos permitirmos.

Em tempo, preconceito mesmo é a retirada de out doors em São Paulo, só porque "alguém" não identificado ligou para a empresa publicitária e não achou "adequada" a foto de um beijo entre dois homens...

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